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Writer's pictureAna Monteiro

Entrevista com a Jornalista Laila Hallack

O perfil de uma das mulheres que atuam no Jornalismo brasileiro

A entrevista a seguir foi baseada numa pesquisa realizada em 2012 pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UFSC em convênio com a Federação Nacional dos Jornalistas –FENAJ. Através dos dados obtidos, foi possível identificar o perfil dos jornalistas brasileiros naquele ano. Tomamos como base as perspectivas atuais político/sociais

Crédito: Laila Hallack


E a ideia é montar o perfil da jornalista Laila Hallack, repórter do Band Notícias, o Jornal das dez da rede Bandeirantes, através das perguntas.


1- Em 2012 os jornalistas brasileiros eram majoritariamente mulheres brancas, solteiras, com até 30 anos, sendo mulher, como você vê esse cenário atualmente?

R= Eu acho que esse cenário não mudou muito. Eu já trabalhei em três redações de TV, duas no estado do Rio e uma em Minas Gerais. Em todas elas, as redações eram compostas por mulheres, geralmente brancas. Essa questão da idade variava um pouco mais, assim, de forma geral, as redações tinham mais pessoas jovens do que mais velhas. Na última redação que eu trabalhei no interior do estado do Rio, eu com 30 anos na época era uma das pessoas mais velhas, esse é um parâmetro de como as redações são formadas por pessoas que estão entrando na carreira ainda que tenham poucos anos de jornalismo. Na redação atual onde eu estou, é um pouco diferente, por ser uma emissora de Capital, uma empresa maior, eles tem profissionais até mais antigos, acima de 40, bastante gente com experiência. E a questão das mulheres eu acho curioso também que apesar de serem maioria, os cargos de chefia quase sempre eram ocupados por homens. Eu já trabalhei com diretores e diretoras, é uma coisa que talvez esteja mudando, mas em outros cargos, nas empresas, nas chefias, as gerências eram mais formadas por homens. Enfim, é uma coisa curiosa, apesar de sermos maioria, em cargos de liderança, não sempre.

2) O percentual de negros entre os jornalistas era inferior à metade da presença de pretos e pardos no Brasil. Ainda hoje, essa discrepância existe?

R= Sim! Infelizmente a gente conta nos dedos. Nessa redação onde eu estou hoje, temos um editor negro e uma repórter negra. Eu tenho um baita orgulho e assim estou muito feliz de trabalhar para um Jornal de Notícias onde a apresentadora é negra. Uma das poucas no país, mas ainda assim, é uma realidade muito desigual. Na redação antiga que eu trabalhava, tinha apenas um repórter negro que também era produtor. A gente consegue contar nas redações com 30, 40, 60 pessoas quantos são negros, isso é um indicativo de que, eles são minoria num país que tem a maioria negra e o que eu vejo é um esforço de encontrar esses profissionais., talvez pelas mudanças da sociedade que hoje exigem mais representatividade e que esses espaços sejam dados. Não sei se é um esforço legítimo, genuíno, mas eu vejo essa tentativa de dar esse espaço e serem mais justos. Talvez “justo” não seja a palavra correta, mas é uma tentativa de ter mais diversidade nas redações.

As redações ainda são muito homogêneas, quando há muitas mulheres, são todas brancas. Eu vejo também um esforço de ter em pautas específicas o profissional que tenha ali um lugar de fala, por exemplo, em uma pauta sobre as mulheres negras, colocar uma repórter negra, numa pauta sobre violência contra a mulher não colocar um homem, e sim uma mulher bota uma mulher. No interior do Rio e também aqui na capital eu acho que as redações ainda estão longe de serem diversas, mas já começaram a buscar essa diversidade. Demorou muito né, considerando o que vivemos diariamente, mas talvez esteja começando a engatinhar, principalmente pela exigência dos movimentos.

3- Metade dos jornalistas se considerava de esquerda, mas quase um terço refutou qualquer classificação ideológica. Na sua profissão, você deixa claro sua posição política? Como lida com o assunto?

R= Olha eu acho que todos nós temos ideologias, temos posicionamentos, temos alinhamento e acreditamos em algumas coisas mais do que em outras, isso é natural do ser humano. Apesar da profissão, a gente carrega isso dentro da gente! Eu acredito que jornalismo por ser uma profissão da área de humanas, por teoricamente ter um caráter humanístico de transformação, de informação como ferramenta para democracia, isso talvez nos leve a ter mais um alinhamento ou até mesmo uma aproximação com pautas consideradas de esquerda. Mas eu acredito também, que a gente vive um momento que não é tanto ser de esquerda ou direita, embora tenha sido classificado assim. Todo mundo hoje em dia é comunista. Eu acho que a gente vive um momento em que o jornalismo acaba se posicionando com relação a ser em defesa da liberdade de expressão, seja em defesa da democracia, ou contra.

Enfim, a gente vive situações que exigem que o jornalista se posicione, o que não quer dizer que ele está abertamente levantando bandeiras. Eu mesma em várias situações tive que lidar com cobertura de manifestações ou situações que são completamente contrárias ao que eu acredito. Mas eu consegui exercer meu papel nessas situações, de ouvir quem estava lá e registrar o fato. Nessas horas, a gente deixa de lado as paixões, a gente deixa de lado as revoltas, mas em alguns casos, como o momento em que a gente viveu, acho que o jornalista é levado a se posicionar. Porque são situações extremas em que a nossa democracia acaba sendo colocada em risco. Então o jornalista tem que ser mais contundente nessas questões.

4- Qual a sua opinião, sobre a defesa de que, para atuar na profissão, o jornalista tem obrigatoriamente de possuir o diploma?

R= Eu não sou uma pessoa teórica e não vi tantas pessoas que pensam sobre o diploma ou não, mas eu sou da defesa do diploma e eu acredito que a formação do jornalista vai muito além da prática. Tudo que eu faço hoje eu aprendi na prática muito mais do que na faculdade. Mas o que eu carrego para me tornar uma profissional mais comprometida com a liberdade de expressão, com as causas de justiça social, com a transformação da sociedade, eu aprendi na faculdade, esse olhar para a profissão além da técnica. Então eu acredito que o diploma é fundamental. Já trabalhei com jornalistas sem diploma, já vi colegas de outras áreas atuando também na TV, na rádio, porque exigiu algum tipo de habilidade específica, não necessariamente a formação jornalística. Eu ainda acredito que os profissionais que se formaram, carregam algo a mais, que eles podem contribuir mais para o produto final e para a nossa profissão como um todo.

5- Qual a importância do estágio na carreira profissional?

R= Eu acho que o estágio é fundamental, porque nem sempre na formação as pessoas têm a oportunidade de exercer as atividades do jornalismo. São experiências muito rápidas em sala de aula e na prática o que a gente consegue é vivenciar o que é a atividade profissional e muitas vezes eu acho que o estágio é importante também, para que as pessoas entendam onde elas querem atuar. Eu por exemplo, fiz estágio na redação e pude entender que era aquilo que eu queria. Tive colegas que fizeram estágio e também entenderam que não era o que queriam. Eu acho que qualquer tipo de experiência já deixa o profissional mais dinâmico, mais antenado, então acredito que o estágio é necessário.

6- Como é trabalhar na TV? Se houver, expor por favor, vantagens e desvantagens.

R= Embora a gente viva no momento em que a internet seja a principal fonte de informação de grande parte da população no Brasil especificamente, eu acho que a TV ainda tem um grande impacto e um grande papel, principalmente a TV aberta em algumas camadas da sociedade. Vejo isso como uma das vantagens. A gente conversa diretamente com um público muito amplo. Temos esse poder da imagem e essa capacidade de contar as histórias de formas diferentes, assim o audiovisual de certa forma, me fascina por conta disso. Tem muitas vantagens como: conhecer pessoas novas, novos lugares e assim ter o contato com realidades distintas das minhas. A vontade de entrar ao vivo é um barato. Eu adoro a adrenalina de entrar tudo ao vivo. Outra vantagem que vejo é não ter rotina, embora a gente trabalhe todo dia teoricamente no mesmo horário, cada dia é um novo dia. Cada dia é um assunto diferente, uma pauta diferente e um desafio diferente, e tudo muda o tempo todo. Então assim, é um trabalho muito dinâmico, muito vivo e eu particularmente sou fascinada por televisão. E agora desvantagens, tem a questão salarial e a questão do próprio dinamismo que eu falei anteriormente. Acaba sendo também um ponto negativo, pois você acaba muitas vezes tendo que virar o horário, deixa de comer, deixa de ir ao banheiro, trabalha feriado, trabalha Natal ou carnaval. Outra desvantagem é a questão de aparecer muito e as pessoas às vezes confundem isso com algum tipo de importância, mas a gente não tem importância alguma, o que importa são os fatos, essa é uma parte delicada, fazer com que as pessoas entendam o nosso papel.

7- Na pesquisa foi indicado que dois terços dos jornalistas tinham renda até cinco salários mínimos e quase metade dos jornalistas trabalhavam mais de oito horas por dia. Qual a sua opinião sobre a carga horária do trabalho como jornalista?

R= Esse é um dilema constante, o de que a remuneração muitas vezes não condiz com as exigências ou que às vezes também, existem colegas da mesma redação ganhando muito, e outros o salário ficou anos sem ter nenhum tipo de reajuste, enfim, é um tipo de falta de plano de carreira, algo que acontece em muitas outras profissões. Eu acredito que talvez os direitos dos jornalistas fiquem mais na teoria do que na prática, sem contar essa falta de consciência de classe também, para que o cenário mude. Acaba sendo um dilema da profissão que com muitos novos jornalistas sendo formados, poucas vagas pelo menos nas redações são oferecidas.

8- “As mulheres jornalistas, mais jovens, ganhavam menos que os homens”. Acredita que isso ainda ocorre, se sim, poderia dissertar sobre o por que, uma vez que ainda atualmente, temos um número maior de mulheres atuantes no jornalismo.

R= Eu não tenho muito parâmetro para dizer, pois não sei o salário dos colegas, e o que eu já vi muito é a diferença de cargo, ou seja, embora tenha chefes mulheres, os cargos digamos da cúpula das decisões da empresa quase sempre eram ocupados por homens.

9- Comparado há 4 anos atrás, como é sua relação com a internet atualmente?

R= Há quatro anos eu já usava bastante a internet para o meu trabalho, desde que comecei como produtora em 2010. Hoje a dependência é muito maior. A gente passa o dia inteiro no WhatsApp, são vários grupos. A tecnologia hoje em dia controla as atividades, vemos isso principalmente na pandemia, em que até as entrevistas passaram a ser feitas de modo remoto. Comparado há quatro anos eu acho que houve esse aumento dessa importância sem dúvida alguma.

10- Como você enxerga sua profissão hoje? E no cenário político atual, quais suas perspectivas para o jornalismo brasileiro?

R= Então além das questões referentes à precarização a desvalorização dos desafios da profissão na profissão, eu acredito que o jornalismo hoje, como a gente pode ver no Brasil e no mundo está ameaçado, não só pelo avanço da tecnologia mas do uso delas para a disseminação de fake news. É uma luta que a gente trava e que as instituições, governos e toda sociedade ainda tentam entender qual é a forma de combater eficientemente essa onda de desinformação. Além disso tudo há uma ameaça também institucional. Em governos como o nosso, que declaradamente ameaçam veículos de imprensa e profissionais da área, mais do que nunca é desafiador ser jornalista. Os ataques nas ruas são muito mais frequentes, os gritos e as ameaças físicas, as ameaças verbais fazem você viver com medo de ser jornalista. Eu tento ver isso como algo positivo que acaba fortalecendo nosso papel na sociedade , porque sem o jornalista a gente não tem jornalismo, a gente não tem uma democracia, Então, eu continuo acreditando no nosso jornalismo, apesar de ser desolador ver colegas talentosos pulando fora do barco porque perderam suas perspectivas, é muito bonito ver em cada momento, em cada situação, o que a gente é capaz de fazer com a boa informação.



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